"Comida por trabalho, já se pede em Portugal.
Querem-nos escravos e prisioneiros.
Um dia descobri os relatos de Viktor Frankl, médico e fundador da logoterapia, sobre a sua experiência como prisioneiro num campo de concentração na Alemanha e, especificamente, sobre os sonhos que os seus companheiros lhe contavam. Sonhos de esperança de libertação com data prevista e que, chegado o dia, não se cumpriam. A aproximação do Natal aumentava a esperança e desencadeava esses sonhos animadores, mas que, chegada a data, logo se perdiam no mais cruel abatimento. Não vale a pena relatar os fins trágicos destes desejos não cumpridos, mas transcrevo uma observação deste médico:
“Quem já não consegue acreditar no futuro – no seu futuro – está perdido num campo de concentração. Juntamente com a esperança no futuro, essa pessoa perde o apoio espiritual, deixa-se «cair» interiormente e decai física e psiquicamente […]” (V. Frankl, Sede de Sentido, Quadrante).
Trago esta experiência na véspera de mais um Natal e a poucos dias de se cumprir um ano de existência da APRe! O momento deve proporcionar uma reflexão sobre esta nossa curta viagem contra a injustiça que atinge a nossa geração e que, por tabela, atinge outras gerações.
O povo trabalhador e os reformados sofrem sucessivos embates que os empurram para graves dificuldades e para a pobreza. São anos e anos de fracassos e de desilusões. Olham para o futuro e não descobrem sinais de mudança. Não são exageradas as palavras dos que falam, hoje, também, em exterminação. Este clima, estas trombadas sucessivas, este campo de concentração que não tem anúncio do seu fim, do qual conhecemos os guardas mas que mantém distantes os seus arquitectos, pode tornar-nos moles, adormecidos, apenas esperançados na sorte, ignorantes da nossa força, frágeis pela idade e pela condição, desconfiados uns dos outros, espiritualmente deprimidos.
Se isto é verdade, para além das bandeiras que levantamos contra as medidas discriminatórias que nos atingem, temos que levantar, também, a bandeira contra o desânimo, contra a apatia, contra a vergonha que alguns parecem sentir por serem reformados, a favor da esperança que não podemos perder.
Não é nada fácil esta luta. Estamos cercados de inimigos interessados em transformar-nos em inimigos de nós próprios, em alimentar dentro de nós as causas da nossa derrota.
Quem dos que aqui se dispõe a estar na frente ainda não foi afectado pelo desânimo?
2014 vai por-nos à prova!
Nelson Mandela será, para nós, um bom exemplo!"
José Gama