27.11.12
Para as Raparigas de Coimbra
Ó choupo magro e velhinho,
Corcundinha, todo aos nós:
És tal qual meu avôzinho,
Falta-te apenas a voz.
Minha capa vos acoite
Que é p'ra vos agazalhar:
Se por fóra é cor da noite,
Por dentro é cor do luar...
Ó sinos de Santa Clara,
Por quem dobraes, quem morreu?
Ah, foi-se a mais linda cara
Que houve debaixo do céu!
A sereia é muito arisca,
Pescador, que estás ao sol:
Não cae, tolinho, a essa isca...
Só pondo uma flor no anzol!
A lua é a hostia branquinha,
Onde está Nosso Senhor:
É d'uma certa farinha
Que não apanha bolor!
Vou a encher a bilha e trago-a
Vazia como a levei!
Mondego, qu'é da tua agoa?
Qu'é dos prantos que eu chorei?
A cabra da velha Torre,
Meu amor, chama por mim:
Quando um estudante morre,
Os sinos chamam, assim.
- E só porque o mundo zomba
Que poes luto? Importa lá!
Antes te vistas de pomba...
- Pombas pretas tambem ha!
Therezinhas! Ursulinas!
Tardes de novena, adeus!
Os corações ás batinas
Que diriam? sabe-o Deus...
Teu coração é uma igreja:
N'uma eça dorme, alli,
Manoel, bemdito seja,
Que morreu d'amor por ti.
Manoel no Pio repoiza:
Todos os dias, lá vou
Ver se quer alguma coiza,
Perguntar como passou.
Agora, são tudo amores
A roda de mim, no Caes,
E, mal se apanham doutores,
Partem e não voltam mais...
Aos olhos da minha fronte
Vinde os cantaros encher:
Não ha, assim, segunda fonte
Com duas bicas a correr!
Nossa Senhora faz meia
Com linha feita de luz:
O novello é a lua-cheia,
As meias são p'ra Jezus.
Meu violão é um cortiço,
Tem por abelhas os sons
Que fabricam, valha-me isso,
Fadinhos de mel, tão bons...
Ó fogueiras, ó cantigas,
Saudades! recordações!
Bailae, bailae, raparigas!
Batei, batei, corações!
António Nobre, in 'Só'